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Carioca, formada em jornalismo, Marcia Cristina iniciou a carreira na área de Comunicação Social do BNH e da Caixa Econômica Federal. Foi repórter de TV em Salvador e editora de reportagens em Curitiba. Em 1995 passou para a área de negócios e foi gerente geral de unidades de negócios da Caixa na Bahia. Pós-graduada em Gerência de Marketing pela ESPM/SP (ministrado em Salvador) e MBA em Gestão Empresarial pela Universidade Católica de Salvador em parceria com a UFRJ. Em 2009 lançou o livro “Ética no Ambiente de Trabalho, editora Campus/Elsevier. Entre 2013 e 2016 trabalhou na área de educação da Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem - ABCD, no Ministério do Esporte, exercendo também a Diretoria de Informação e Educação em defesa da Ética no Esporte. Em 2018 participou da coletânea, Criativos, Inovadores e Vencedores, editado pela Literare Books, São Paulo e lançou o segundo livro solo, Conduta Ética e Sustentabilidade Empresarial, pela editora Alta Books. Vive agora em Portugal.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

O que é "ser ético"?



Definir ética não é muito simples. Definir o que é “ser ético” é ainda mais complicado.
Ética é aquele conceito que todo mundo sabe o que é, mas não sabe explicar direito. Ser ético é um comportamento que busca sempre fazer o que é certo, mas que não evita que alguém diga que aquela atitude não foi correta, ou não foi ética.
De repente a ética entrou na moda. Já não era sem tempo!
A palavra ética se origina do termo grego ethos, que significa "modo de ser", "caráter", "costume", "comportamento". Em filosofia, a ética é o estudo desses aspectos do ser humano: por um lado, procurando descobrir o que está por trás do nosso modo de ser e de agir; por outro, procurando estabelecer as maneiras mais convenientes de sermos e agirmos.
Não há unanimidade sobre a origem etimológica da palavra ética. Alguns teóricos defendem que o termo “ética” corresponde à palavra latina “morale”, que tem o mesmo significado. Vamos então considerar que ética e moral são palavras sinônimas, pelo menos em sua origem.
Entretanto, a Moral estabelece regras comuns a uma sociedade, que são assumidas pela pessoa. Ética é o que diferencia o que é bom ou mau, correto ou incorreto, justo ou injusto, conceitos esses que podem variar de pessoa para pessoa. Ou seja, a ética é pessoal e flexível. Varia conforme o ponto de vista do indivíduo que analisa cada situação, ou cada dilema ético, com base em concepções próprias.
Imagem copiada do site www.neadsenaies.com.br
Os Dilemas Éticos

Os dilemas éticos estão presentes na vida de todas as pessoas com muita freqüência, mesmo que a maioria delas nem se dê conta disso. Dilemas éticos podem ser decididos em frações de segundo, mas sempre serão guiados por um dos três focos de avaliação possíveis.
1.     Visão utilitarista - considera as perdas e os benefícios que a decisão vai ou pode provocar;
2.     Visão focada nos princípios - que se ampara nas convicções pessoais de quem decide, sem considerar as consequências possíveis;
3.     Visão focada na integridade - justificada pelas razões que motivaram aquela decisão.
As decisões costumam sofrer interferência da cultura na qual o indivíduo está inserido. Quando a cultura estabelecida aceita o egocentrismo e o materialismo, e valoriza o poder e o dinheiro, as decisões certamente sofrerão influência desses aspectos e podem ficar eticamente comprometidas, principalmente no que tange aos valores morais de honestidade e de sinceridade.

A ética no Brasil e no Mundo

No Brasil existe um complicador: a aceitação, ou até mesmo a admiração da “esperteza” praticada por pessoas que procuram meios ilícitos para “se dar bem”. Essa prática deu origem à expressão “jeitinho brasileiro”, um costume do qual não deveríamos nos orgulhar. Por que esse tipo de conduta ainda é tão comum e tolerada pela sociedade brasileira, mesmo entre pessoas mais conscientes e esclarecidas?
Mesmo aceitando a hipótese de que o ser ético tenha um componente congênito, não podemos ignorar que cidadãos não nascem prontos, eles são formados. A cultura da sociedade em que cada ser humano está inserido, com suas crenças e costumes, assim como a religião e a educação que recebem em casa e na escola, formam conceitos de direitos e deveres que vão sendo assimilados pelas pessoas desde o berço.
Qual a diferença entre os cidadãos dos países mais desenvolvidos e os cidadãos dos países menos desenvolvidos? Por que em países da Europa Ocidental, como na Alemanha, o serviço de metrô não necessita de torniquetes ou qualquer tipo de exigência quanto ao bilhete que comprova o pagamento da passagem e, ainda assim, as pessoas pagam “espontaneamente” por suas viagens? Por que as pessoas nascidas e educadas em países desenvolvidos respeitam mais as regras e as leis? Será por que as penalidades e multas são pesadas e realmente aplicadas aos que são pegos em flagrante delito? Ou será que a formação da cidadania explica tudo? Ou será, ainda, uma soma desses dois fatores?
Um exemplo interessante acontece ainda na infância dos estudantes brasileiros. Uma ideia enraizada há décadas nas escolas, sejam elas públicas ou privadas, fomenta o conceito de que os alunos que fazem tudo muito certinho não são merecedores de admiração. Muito pelo contrário, esses alunos sofrem críticas, são alvos de deboche e acabam até mesmo sendo excluídos e marginalizados pelos alunos mais populares. São os chamados “CDF”, uma referência ao tempo que os melhores alunos gastam ficando sentados para estudar.
Esse triste costume, também alimentado pela inveja de pessoas menos talentosas, não é um padrão de comportamento universal.
O sistema de avaliação das universidades americanas para seleção de novos alunos considera o histórico escolar desde os primeiros anos de estudo para definir aqueles que têm condições de ingressar em seus cursos.
Um aluno que estuda desde cedo na rede pública americana - Elementary, Middle e High-school, é avaliado permanentemente. A partir do terceiro ano do elementary, o aluno exemplar passa a estudar numa turma "gifted". Nessa turma, todos os "grades" (notas) passam a ter um peso maior, e a matéria é sempre mais difícil. Se o aluno continuar a tirar A's e B's + ele vai manter-se como aluno especial, só que a turma muda de nome: são os "honors". E assim ele vai até o high-school. 
Nos Estados Unidos não existem universidades gratuitas, mas existem bolsas de estudo. Para conseguir esse benefício, é preciso ter as melhores notas. Também conta pontos a favor o número de horas de serviços comunitários prestados pelos estudantes, uma forma de exercitar a humildade e conviver com as necessidades de pessoas carentes.
Outra diferença entre os sistemas de ensino brasileiro e americano é que lá, antes do curso universitário propriamente dito, existe o college, um tipo de curso introdutório aos cursos específicos. Os alunos podem cursar, ainda no High School, algumas matérias dessa etapa. Quanto mais matéria de college ele fizer no High School mais ele vai ter chances na Universidade, pois estará na frente dos colegas. Alunos com os melhores desempenhos têm acesso não apenas às melhores universidades como também a maiores percentuais de bolsas de estudo.
É claro que as melhores universidades selecionam os melhores alunos. Lá, um estudante que aparece bronzeado num dia de prova e comenta que não estudou porque preferiu ir à praia, será percebido com certa desconfiança quanto às suas pretensões.
Não obstante, é provável que contribua para que os alunos das escolas americanas busquem obter melhores resultados o fato de que lá as pessoas que não são bem sucedidas são chamadas de “losers”, que significa “perdedores”. Ser chamado de “loser” é uma das maiores ofensas que podem ser feitas a um cidadão americano. Alunos que agem de forma irresponsável com relação a suas notas nas provas sabem que podem estar caminhando para se tornarem futuros perdedores.
Não estou aqui defendendo esse tipo de massacre psicológico imposto pelas regras do capitalismo impiedoso da terra do Tio Sam, onde a competição é a regra, e o resultado considera principalmente o sucesso profissional representado pelo valor do salário e dos bens acumulados. Lá, esquecem de medir a felicidade de alguém que prefira cultivar outros valores. Uso o exemplo apenas para comparação entre dois extremos de observação sobre um mesmo comportamento.
O que chama a atenção é que no Brasil bons estudantes chegam ao extremo de sentir vergonha em assumir que estudaram para a prova. Preferem dizer que “chutaram” as respostas e que contam com a sorte para justificar bons resultados. Agem assim porque buscam ser bem aceitos pela turma.
Um costume brasileiro tolerado, mas que devia causar indignação, é a pratica da “cola” ou “pesca”. Muito professores sabem que a cola acontece durante as provas, mas não têm coragem de reprimir e optam por não criar conflito ao inibir a troca de informações entre os alunos. Muitos alunos que estudaram e estão preparados aceitam passar a cola para não serem marginalizados e excluídos.
Esse costume é preservado porque está protegido pela omissão dos professores, dos pais e dos diretores das escolas. Criou-se até uma expressão para justificar essa prática desonesta: “Quem não cola não sai da escola”! No Brasil a “cola” está institucionalizada, e raros professores se esforçam para combater essa praga.
Qual o tipo de cidadãos estamos formando ao permitir que essas praticas sejam perpetuadas?
Por outro lado, não é verdadeiro afirmar que a mudança no sistema educacional é a solução definitiva para a falta de ética. Se fosse assim, não haveria casos de conduta antiética registrados entre americanos e europeus.
É preciso considerar a índole, o caráter ou a situação que cada pessoa está vivendo no momento que toma uma decisão errada.
A decisão de um pai de corromper dois policiais que cobraram propina para não registrar a ocorrência de um atropelamento ocorrido de madrugada  em um túnel da zona sul do Rio de Janeiro foi muito comentada na imprensa. O rapaz invadiu com o carro a pista que estava interditada e acabou matando um jovem de 18 anos que aproveitava a pista fechada ao tráfego para praticar “skate”. Na manhã seguinte, esse mesmo pai apressou-se em deixar o carro na oficina com o objetivo de “apagar” os vestígios do atropelamento. Que tipo de ensinamento esse pai pretendia passar a seu filho? Que o dinheiro deve ser usado como instrumento de perdão de erros irreparáveis? Será que o comportamento desse mesmo pai em situações anteriores serviram para incentivar o filho a achar que sua condição social lhe permitia violar leis e regras diversas? Talvez sim, talvez não, só a família pode responder a essa pergunta.
A compra do silêncio dos policiais corruptos só não aconteceu porque a vítima era filho de uma atriz famosa e o acidente tornou-se motivo de comoção nacional.
Não obstante, o fato de que a vítima também desrespeitou a ordem de interdição ao tráfego, há que se destacar que um passeio de skate não oferece maiores riscos de acidentes, já um automóvel em alta velocidade configura uma ameaça à integridade física dos eventuais trabalhadores que poderiam estar fazendo a manutenção daquela via.
O que precisa ser questionado é a intenção desse pai que, ao tentar usar de meios ilícitos para preservar a impunidade do filho, não demonstrou preocupação em saber que tipo de lição estava passando a ele no que se refere a cidadania, respeito a vida alheia e a ética.
Por outro lado, é muito fácil condenar alguém que buscou uma forma, digamos, alternativa de conseguir algum dinheiro. Entretanto, qual seria a própria atitude de quem condena, se estivesse passando pela mesma dificuldade da pessoa que agiu de forma incorreta? Quem nunca viu a despensa de sua casa vazia ou sentiu a dor da falta de dinheiro para comprar um remédio para um filho doente, não pode afirmar categoricamente que não cometeria alguma falta.
Além disso, ser considerada uma pessoas ética não é nada fácil, ainda mais quando se busca a unanimidade de julgamento.
Filosofando um pouco a esse respeito, lembrando que uma das definições da ética é “fazer o bem”, não se pode deixar de ressaltar que o que representa o “bem” para uma pessoa pode representar o “mal”, na visão de outra pessoa.
Cada decisão de um dilema ético exige uma opção por um caminho ou por alguém. Provavelmente, a pessoa que foi preterida, ou que não teve seus objetivos atendidos, vai considerar que foi prejudicada e que o decisor não agiu corretamente e, portanto, não foi ético porque não considerou esse ou aquele aspecto em sua decisão.
Diante de tantas situações com variadas nuances envolvidas em cada dilema e que embasam escolhas feitas durante a vida, é importante para quem pretende ser ético ter a convicção de que as decisões estão sendo tomadas com as melhores intenções e que podem ser justificadas de forma transparente e coerente.