Definir
ética não é muito simples. Definir o que é “ser ético” é ainda mais complicado.
Ética
é aquele conceito que todo mundo sabe o que é, mas não sabe explicar direito.
Ser ético é um comportamento que busca sempre fazer o que é certo, mas que não
evita que alguém diga que aquela atitude não foi correta, ou não foi ética.
De
repente a ética entrou na moda. Já não era sem tempo!
A palavra ética se origina do termo grego ethos, que significa "modo de
ser", "caráter", "costume", "comportamento".
Em filosofia, a ética é o estudo desses aspectos do ser humano: por um lado,
procurando descobrir o que está por trás do nosso modo de ser e de agir; por
outro, procurando estabelecer as maneiras mais convenientes de sermos e agirmos.
Não há unanimidade sobre a origem etimológica da
palavra ética. Alguns teóricos defendem que o termo “ética” corresponde à
palavra latina “morale”, que tem o mesmo significado. Vamos então considerar
que ética e moral são palavras sinônimas, pelo menos em sua origem.
Entretanto, a Moral estabelece
regras comuns a uma sociedade, que são assumidas pela pessoa. Ética é o que
diferencia o que é bom ou mau, correto ou incorreto, justo ou injusto,
conceitos esses que podem variar de pessoa para pessoa. Ou seja, a ética é
pessoal e flexível. Varia conforme o ponto de vista do indivíduo que analisa
cada situação, ou cada dilema ético, com base em concepções próprias.
Imagem copiada do site www.neadsenaies.com.br |
Os Dilemas Éticos
Os dilemas éticos estão
presentes na vida de todas as pessoas com muita freqüência, mesmo que a maioria
delas nem se dê conta disso. Dilemas éticos podem ser decididos em frações de
segundo, mas sempre serão guiados por um dos três focos de avaliação possíveis.
1. Visão utilitarista - considera as perdas e os
benefícios que a decisão vai ou pode provocar;
2. Visão focada nos princípios - que se ampara nas convicções pessoais de
quem decide, sem considerar as consequências possíveis;
3. Visão focada na integridade - justificada pelas razões que motivaram
aquela decisão.
As decisões costumam sofrer interferência da
cultura na qual o indivíduo está inserido. Quando a cultura estabelecida aceita
o egocentrismo e o materialismo,
e valoriza o poder e o dinheiro, as decisões certamente sofrerão influência
desses aspectos e podem ficar eticamente comprometidas, principalmente no que tange
aos valores morais de honestidade e de sinceridade.
A ética no Brasil e no Mundo
No Brasil existe um complicador:
a aceitação, ou até mesmo a admiração da “esperteza” praticada por pessoas que
procuram meios ilícitos para “se dar bem”. Essa prática deu origem à expressão
“jeitinho brasileiro”, um costume do qual não deveríamos nos orgulhar. Por que
esse tipo de conduta ainda é tão comum e tolerada pela sociedade brasileira,
mesmo entre pessoas mais conscientes e esclarecidas?
Mesmo aceitando a hipótese de que
o ser ético tenha um componente congênito, não podemos ignorar que cidadãos não
nascem prontos, eles são formados. A cultura da sociedade em que cada ser
humano está inserido, com suas crenças e costumes, assim como a religião e a
educação que recebem em casa e na escola, formam conceitos de direitos e
deveres que vão sendo assimilados pelas pessoas desde o berço.
Qual a diferença entre os
cidadãos dos países mais desenvolvidos e os cidadãos dos países menos
desenvolvidos? Por que em países da Europa Ocidental, como na Alemanha, o
serviço de metrô não necessita de torniquetes ou qualquer tipo de exigência
quanto ao bilhete que comprova o pagamento da passagem e, ainda assim, as
pessoas pagam “espontaneamente” por suas viagens? Por que as pessoas nascidas e
educadas em países desenvolvidos respeitam mais as regras e as leis? Será por que
as penalidades e multas são pesadas e realmente aplicadas aos que são pegos em
flagrante delito? Ou será que a formação da cidadania explica tudo? Ou será,
ainda, uma soma desses dois fatores?
Um exemplo interessante
acontece ainda na infância dos estudantes brasileiros. Uma ideia enraizada há
décadas nas escolas, sejam elas públicas ou privadas, fomenta o conceito de que
os alunos que fazem tudo muito certinho não são merecedores de admiração. Muito
pelo contrário, esses alunos sofrem críticas, são alvos de deboche e acabam até
mesmo sendo excluídos e marginalizados pelos alunos mais populares. São os chamados
“CDF”, uma referência ao tempo que os melhores alunos gastam ficando sentados para
estudar.
Esse triste costume, também
alimentado pela inveja de pessoas menos talentosas, não é um padrão de
comportamento universal.
O sistema de avaliação das
universidades americanas para seleção de novos alunos considera o histórico
escolar desde os primeiros anos de estudo para definir aqueles que têm
condições de ingressar em seus cursos.
Um aluno que estuda desde cedo na
rede pública americana - Elementary, Middle e High-school, é avaliado
permanentemente. A partir do terceiro ano do elementary, o aluno exemplar
passa a estudar numa turma "gifted". Nessa turma, todos os "grades"
(notas) passam a ter um peso maior, e a matéria é sempre mais difícil. Se o
aluno continuar a tirar A's e B's + ele vai manter-se como aluno especial, só
que a turma muda de nome: são os "honors". E assim ele vai até o
high-school.
Nos
Estados Unidos não existem universidades gratuitas, mas existem bolsas de
estudo. Para conseguir esse benefício, é preciso ter as melhores notas. Também conta
pontos a favor o número de horas de serviços comunitários prestados pelos
estudantes, uma forma de exercitar a humildade e conviver com as necessidades
de pessoas carentes.
Outra
diferença entre os sistemas de ensino brasileiro e americano é que lá, antes do
curso universitário propriamente dito, existe o college, um tipo de curso introdutório aos cursos específicos. Os
alunos podem cursar, ainda no High School, algumas matérias dessa etapa. Quanto
mais matéria de college ele fizer no
High School mais ele vai ter chances na Universidade, pois estará na frente dos
colegas. Alunos com os melhores desempenhos têm acesso não apenas às melhores
universidades como também a maiores percentuais de bolsas de estudo.
É claro que as melhores
universidades selecionam os melhores alunos. Lá, um estudante que aparece
bronzeado num dia de prova e comenta que não estudou porque preferiu ir à
praia, será percebido com certa desconfiança quanto às suas pretensões.
Não obstante, é provável que contribua para
que os alunos das escolas americanas busquem obter melhores resultados o fato
de que lá as pessoas que não são bem sucedidas são chamadas de “losers”, que
significa “perdedores”. Ser chamado de “loser” é uma das maiores ofensas que
podem ser feitas a um cidadão americano. Alunos que agem de forma irresponsável
com relação a suas notas nas provas sabem que podem estar caminhando para se tornarem
futuros perdedores.
Não estou aqui defendendo esse
tipo de massacre psicológico imposto pelas regras do capitalismo impiedoso da
terra do Tio Sam, onde a competição é a regra, e o resultado considera
principalmente o sucesso profissional representado pelo valor do salário e dos
bens acumulados. Lá, esquecem de medir a felicidade de alguém que prefira
cultivar outros valores. Uso o exemplo apenas para comparação entre dois
extremos de observação sobre um mesmo comportamento.
O que chama a atenção é que no
Brasil bons estudantes chegam ao extremo de sentir vergonha em assumir que
estudaram para a prova. Preferem dizer que “chutaram” as respostas e que contam
com a sorte para justificar bons resultados. Agem assim porque buscam ser bem
aceitos pela turma.
Um costume brasileiro tolerado,
mas que devia causar indignação, é a pratica da “cola” ou “pesca”. Muito professores sabem que a cola acontece durante
as provas, mas não têm coragem de reprimir e optam por não criar conflito ao
inibir a troca de informações entre os alunos. Muitos alunos que estudaram e
estão preparados aceitam passar a cola para não serem marginalizados e excluídos.
Esse costume é preservado
porque está protegido pela omissão dos professores, dos pais e dos diretores
das escolas. Criou-se até uma expressão para justificar essa prática desonesta:
“Quem não cola não sai da escola”! No Brasil a “cola” está institucionalizada,
e raros professores se esforçam para combater essa praga.
Qual o tipo de cidadãos
estamos formando ao permitir que essas praticas sejam perpetuadas?
Por outro lado, não é
verdadeiro afirmar que a mudança no sistema educacional é a solução definitiva para
a falta de ética. Se fosse assim, não haveria casos de conduta antiética
registrados entre americanos e europeus.
É preciso considerar a índole,
o caráter ou a situação que cada pessoa está vivendo no momento que toma uma
decisão errada.
A decisão de um pai de
corromper dois policiais que cobraram propina para não registrar a ocorrência
de um atropelamento ocorrido de madrugada em um túnel da zona sul do Rio de Janeiro foi
muito comentada na imprensa. O rapaz invadiu com o carro a pista que estava
interditada e acabou matando um jovem de 18 anos que aproveitava a pista
fechada ao tráfego para praticar “skate”. Na manhã seguinte, esse mesmo pai
apressou-se em deixar o carro na oficina com o objetivo de “apagar” os
vestígios do atropelamento. Que tipo de ensinamento esse pai pretendia passar a
seu filho? Que o dinheiro deve ser usado como instrumento de perdão de erros
irreparáveis? Será que o comportamento desse mesmo pai em situações anteriores
serviram para incentivar o filho a achar que sua condição social lhe permitia
violar leis e regras diversas? Talvez sim, talvez não, só a família pode
responder a essa pergunta.
A compra do silêncio dos
policiais corruptos só não aconteceu porque a vítima era filho de uma atriz
famosa e o acidente tornou-se motivo de comoção nacional.
Não obstante, o fato de que a
vítima também desrespeitou a ordem de interdição ao tráfego, há que se destacar
que um passeio de skate não oferece maiores riscos de acidentes, já um
automóvel em alta velocidade configura uma ameaça à integridade física dos
eventuais trabalhadores que poderiam estar fazendo a manutenção daquela via.
O que precisa ser questionado
é a intenção desse pai que, ao tentar usar de meios ilícitos para preservar a
impunidade do filho, não demonstrou preocupação em saber que tipo de lição
estava passando a ele no que se refere a cidadania, respeito a vida alheia e a ética.
Por outro lado, é muito fácil
condenar alguém que buscou uma forma, digamos, alternativa de conseguir algum
dinheiro. Entretanto, qual seria a própria atitude de quem condena, se estivesse
passando pela mesma dificuldade da pessoa que agiu de forma incorreta? Quem
nunca viu a despensa de sua casa vazia ou sentiu a dor da falta de dinheiro
para comprar um remédio para um filho doente, não pode afirmar categoricamente
que não cometeria alguma falta.
Além disso, ser considerada
uma pessoas ética não é nada fácil, ainda mais quando se busca a unanimidade de
julgamento.
Filosofando um pouco a esse
respeito, lembrando que uma das definições da ética é “fazer o bem”, não se
pode deixar de ressaltar que o que representa o “bem” para uma pessoa pode
representar o “mal”, na visão de outra pessoa.
Cada decisão de um dilema
ético exige uma opção por um caminho ou por alguém. Provavelmente, a pessoa que
foi preterida, ou que não teve seus objetivos atendidos, vai considerar que foi
prejudicada e que o decisor não agiu corretamente e, portanto, não foi ético
porque não considerou esse ou aquele aspecto em sua decisão.
Diante de tantas situações com
variadas nuances envolvidas em cada dilema e que embasam escolhas feitas durante
a vida, é importante para quem pretende ser ético ter a convicção de que as
decisões estão sendo tomadas com as melhores intenções e que podem ser justificadas
de forma transparente e coerente.